domingo, 18 de janeiro de 2009

Um cerco de Aids, tuberculose e fome no Camboja

Saúde:
Um cerco de Aids, tuberculose e fome no Camboja
Marwaan Macan-Markar

Bangcoc, 07/02/2007, (IPS) - A redução dos fundos que o Programa Mundial de Alimentos (PMA) destina ao Camboja agrava o desespero das 740 mil pessoas que recebem sua ajuda, entre crianças, portadores do vírus HIV causador da Aids e tuberculosos.

Os sinais da crise alimentar neste país, um dos mais pobres do sudeste da Ásia, surgiram em outubro, quando os fundos de doares internacionais começaram a se esgotar, disse o diretor do PMA para o Camboja, Thomas Keusters. Desde então, “tivemos de reduzir nossa assistência às escolas, e agora suspendemos projetos-chave até melhorar a situação dos recursos”, acrescentou.

Além de atender 650 mil crianças, o PMA, uma agência da Organização das Nações Unidas, entregava através de seus 1.800 postos de distribuição no Camboja, alimentos para 70 mil adultos afetados pelo HIV e a 18 mil tuberculosos. Porém, os gestores da iniciativa tinham a idéia de conseguir maior alcance em comunidades rurais açoitadas pela pobreza. “Fomos forçados a suspender estes projetos”, afirmou Keusters à IPS desde Phnom Penh. O PMA esperava receber dinheiro novo para seu programa neste país no final de janeiro, US$ 10 milhões para comprar 18 mil toneladas de alimentos para distribuição até meados deste ano.

Os doadores tradicionais são Austrália e Japão. As organizações não-governamentais que trabalham com o PMA para ajudar os cambojanos que vivem com o vírus da Aids se preocupam pelas conseqüências da falta de alimentos. O Camboja é um dos três países do sudeste da Ásia com maior incidência de HIV/Aids , junto com Birmânia e Tailândia. Segundo o Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/Aids (Onusida), a prevalência dessa doença entre cambojanos com idade de 15 a 49 anos é, em média, de 1,6% (entre 0,9% e 2,6%, nas diversas faixas etárias).

A entrega de ajuda alimentar aos cambojanos pobres que vivem com HIV ou com o bacilo de Koch, causador da tuberculose, abriu um vínculo entre os que necessitam de remédios e os pontos de distribuição de alimentos. “Os pacientes precisam de comida antes de tomar os medicamentos. Não se pode ingerir a medicação de estômago vazio. É preciso manter um equilíbrio”, disse em uma entrevista Haidy Ear-Dupuy, diretora do escritório em Phnom Penh da World Vision, uma agência humanitária cristã. “As pessoas com HIV e tuberculose serão as mais prejudicadas com a redução dos fundos”, assegurou.

A World Vision, que trabalha em cinco províncias de predomínio rural, garantia a cada chefe de família com HIV o fornecimento regular de ajuda alimentar que incluía 15 quilos de arroz por mês, óleo para cozinhar, açúcar e sal. “Também os ajudamos a conseguir os remédios e damos assessoria psicológica”, acrescentou Ear-Dupuy. “A nutrição é uma parte essencial do pacote de assistência às pessoas que recebem tratamento para HIV e tuberculose”, disse Peter Piot, diretor da Onusida. “Os cortes no orçamento colocam em risco a efetividade destas intervenções críticas”.

As dificuldades que os pobres do Camboja enfrentam apresentam agudas perguntas em relação ao alivio, a propósito da desigual distribuição do crescimento econômico em um país que luta para se recuperar após duas décadas de uma brutal guerra civil e da destruição causada durante a Guerra do Vietnã (1964-1975). A paz foi restabelecida no começo dos anos 90, mas levou muito tempo para que todo o país se beneficiasse do fim da violência. No final do ano passado, por exemplo, o governo do primeiro-ministro, Hun Sem, anunciou planos para gastar US$ 20 milhões para melhorar a infra-estrutura em Siem Reap a fim de estimular o turismo.

Esse povoado, no Camboja ocidental, esteve marcado pelo crescimento, incluindo um aumento na quantidade de hotéis, devido à sua proximidade com os famosos templos de Angkor Vat. Funcionários cambojanos esperam que o turismo gere 360 mil postos de trabalho e US$ 2,3 bilhões em ganhos até 2010, informou o jornal Phnom Penh Post em uma notícia publicada em dezembro. Mas além de Siem Reap, Sihanoukville e Phnom Penh, os principais centros turísticos a partir de onde o país parece se recuperar em um ritmo sustentável, existem vastas áreas nas províncias onde a pobreza é enorme.

“Os benefícios do crescimento não chegaram às áreas rurais. O Camboja tem níveis muito elevados de pobreza e insegurança alimentar”, disse Keusters. O Instituto Internacional de Pesquisa sobre Políticas Alimentares (Ifpri) recordou ao governo de Hun Sen o quanto era crítica a situação em 2006, quando essa organização de especialistas com sede nos Estados Unidos colocou o Camboja entre os 12 pontos de maior fome do mundo em seu Índice global da Fome. Os outros 11 países pertenciam à África subsaariana.

O Ifpri usou três indicadores para elaborar o índice: desnutrição infantil, mortalidade infantil e estimativas sobre as pessoas com deficiências calóricas. Na ocasião o instituto disse que os países mais afetados compartilham uma história em comum: foram “afetados por guerras civis ou conflitos violentos”. Quase 35% dos 11,5 milhões de habitantes do Camboja vivem abaixo da linha de pobreza, e o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) o situou no 129º lugar entre 177 países em seu anual Informe de Desenvolvimento Humano. A expectativa de vida no país é de 56 anos, uma das menores da região, diz o Informe. (IPS/Envolverde) (FIN/2007)

* Extraído do IPS Brasil
Disponível em http://www.mwglobal.org/ipsbrasil.net/nota.php?idnews=2561

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